Retorno de André Moura à Casa Civil não deve impedir impeachment de Witzel, dizem deputados
Reconhecido como um político de bom trânsito na Assembleia Legislativa (Alerj), André Moura reassume a Secretaria de Estado e Casa Civil e Governança 56 dias após ser demitido da pasta. Seu retorno, oficializado quinta-feira, foi elogiado nesta sexta-feira por vários deputados, mas, na opinião deles, não impedirá a continuidade do processo de impeachment contra o governador Wilson Witzel, investigado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) por irregularidades na Saúde. A última cartada acontece a menos de uma semana do fim do prazo para a entrega de sua defesa à Casa.
Moura havia ocupado o cargo de secretário da Casa Civil de dezembro de 2019 a maio. Saiu ao fim de uma queda de braço com o ex-secretário de Desenvolvimento Econômico Lucas Tristão, exonerado mês passado e acusado por deputados de ter ordenado a montagem de um sistema de escuta clandestina na Alerj, supostamente para a elaboração de dossiês. Agora, Moura inicia uma corrida contra o tempo, mas, entre parlamentares, há quem diga que não sofrerá uma derrota mesmo que não cruze a linha de chegada, pois já teria lugar garantido numa eventual posse do vice-governador, Cláudio Castro.
Na Alerj, o retorno de Moura aos trabalhos de interlocução é considerado um ato de desespero de Witzel. Castro, que nega a intenção de assumir o comando do Palácio Guanabara, diz não ver a situação dessa maneira, mas acha que as constantes trocas no secretariado — são nove em dois meses — “passam um sinal negativo”.
— Fica a impressão de que toda hora tem alguém querendo ir embora, apesar de não ser sempre assim. Não há dúvidas de que é uma imagem ruim, mas vamos lutar para que não aconteçam mais mudanças — afirmou nesta sexta-feira Castro, acrescentando que telefonou para Moura pedindo sua volta e que não o imagina como assessor na hipótese de Witzel sair do palácio. — Eu não falo sobre secretaria com ninguém enquanto o governador estiver lá. Até porque meu trabalho é evitar o impeachment. Não tenho compromisso com Moura.
Um olho em Sergipe
As conversas entre Witzel e Moura se iniciaram no último dia 1º em Brasília, na reunião da executiva nacional do PSC. O acordo para seu retorno foi selado quinta-feira. Dizendo-se comprometido com as eleições municipais em Sergipe, seu estado, Moura ficou reticente num primeiro momento. Hoje, rejeita o rótulo de “salvador da pátria” e alega que sua missão é “garantir a governabilidade”.
— O estado não pode parar por causa de um impeachment. Vou dialogar com o parlamento, nada diferente do que eu sempre fiz. Construir entendimentos, seja com a base ou a oposição. Mas não vai ser mérito meu se o governador for absolvido, assim como não será demérito se não for — argumentou Moura pouco antes de embarcar rumo a Aracaju para “fazer as malas da mudança”.
Viagens a Sergipe nos finais de semana deverão ser frequentes, pois ele continuará trabalhando junto às 33 candidaturas majoritárias do PSC no estado, com destaque para a de sua mulher, prefeita de Japaratuba. Diferentemente de Castro, Moura não considera as constantes mudanças de secretários no governo como algo negativo, e afirmou que, se for preciso, acontecerão novas trocas:
— Nenhum secretário é imexível. Se resultados não forem alcançados, melhor trocar do que insistir no erro. Não tenho dúvidas de que mudanças serão feitas se forem necessárias.
“Desespero”
Para parte dos deputados, as trocas sucessivas e o retorno de Moura sinalizam instabilidade no governo.
— Há um certo grau de desespero. Agora volta um secretário que havia sido escorraçado e sai Cleiton Rodrigues, que estava com Witzel desde o início. Enquanto isso, o governador tem até quinta-feira para entregar sua defesa. Acho bastante difícil Moura ter êxito — disse Luiz Paulo, que representa o PSDB na comissão de impeachment.
Para Renan Ferreirinha (PSB), também da comissão, o retorno de Moura “mostrou a fragilidade de Witzel e a força do Pastor Everaldo (presidente do PSC, com quem o governador estaria tendo diferenças):
— Em maio, Witzel mudou as pastas mais importantes; ou seja, sua estratégia foi um fracasso nos últimos dois meses.
Martha Rocha (PDT), Flávio Serafini (PSOL) e Chico Machado (PSD), presidente da comissão, manifestaram opiniões semelhantes. No entanto, também há quem veja chance de Moura virar o jogo.
“Quem foi líder do governo Michel Temer e segurou um impeachment entende muito de deputado. Moura é uma águia”, disse um parlamentar sob condição de anonimato, lembrando ainda que o secretário responde a três ações no Supremo Tribunal Federal por acusações de desvios de verbas no interior de Sergipe. — É um homem que age nas sombras —, ascrescentou.
Moura respondeu que venceu os processos nas primeiras instâncias da Justiça e que os casos só chegaram ao STF porque houve recursos do Ministério Público Federal. “Minhas contas sempre foram aprovadas”, argumentou.
Estratégia pronta
Enquanto aposta em Moura para convencer deputados de que desconhecia irregularidades nos contratos para a construção de hospitais de campanha e compra de equipamentos, Witzel também tenta impedir o impeachment no STF. Como o tribunal está em recesso, caberia ao presidente Dias Toffoli se manifestar sobre uma possível liminar. No entanto, nem o próprio governo do estado acredita que isso acontecerá antes de quinta-feira, e, por isso, a estratégia de defesa na Alerj está traçada.
— Vamos mostrar que não há crime imputado ao governador. Não há provas materiais que comprovem o crime de responsabilidade, e o delator Gabriell Neves (ex-subsecretário de Saúde) disse que não tinha se reunido com ele. Todo o restante é especulação — afirmou Manoel Peixinho, um dos advogados de Witzel no processo.
Fonte: O GLOBO
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